O falível viés da comparação

Em aula proferida aos meus alunos recentemente, abordei um tema o qual reforçava a importância da valorização do esporte feminino no Brasil. Felizmente, percebi que grande parte dos discentes de ambos os sexos pratica atividades físicas regularmente, entre elas alguns esportes considerados, historicamente, de caráter masculino. Essa mudança cultural não foi unânime, porém, visto que ouvi naquele dia e ainda ouço relatos de proibição da prática de algumas modalidades. De fato, meninas encontram dificuldades ora para seguirem sonhos no ramo esportivo, ora para simplesmente encararem o exercício como um simples benefício momentâneo à saúde. Então, em período de Copa do Mundo Feminina de Futebol FIFA, pensemos:  do corpo familiar ao parâmetro profissional, há posicionamentos contundentes a favor da equidade no setor?

Em caráter indubitável, a política desacelerou, durante décadas, o sonho feminino ao profissionalismo desportivo. Ao revisar documentos históricos, constatei que, na Era Vargas, em 1941, foi publicado um Decreto, no qual havia a proibição explícita às mulheres da “prática de desportos incompatíveis com as condições da natureza feminina”. A partir desse péssimo exemplo governamental, a grande massa, a qual já compactuava com tal pensamento retrógrado, via-se encorajada a propagar a ideia de que a predileção pela atividade física deveria ser exclusivamente masculina, ótica a qual se estendeu aos dias atuais. Apesar das barreiras impostas a elas hoje, em diversas modalidades, alguns destaques vão na contramão dessa tendência: da Rayssa Leal, no esqueite, à Marta, no futebol de campo, as meninas – felizmente – têm provado que a sociedade errou e ainda erra ao negar as oportunidades às competidoras.

Ademais, muitas vezes o próprio setor esportivo desfavorece a mudança cultural quanto ao papel das jogadoras hodiernamente. Destaco, a título de exemplificação, a premiação paga às atletas no futebol: segundo o jornal Folha S. Paulo, serão distribuídos, ao final da Copa do Mundo, US$ 125 milhões para as seleções como remuneração, valor muito inferior aos US$ 440 milhões oferecidos aos homens no ano passado, no Qatar. Isso é apenas a demonstração midiática de uma questão cotidiana bastante recorrente, pois das aulas de educação física, em que menino joga futebol e menina brinca de queimada, até a não oficialização de pontos facultativos no mercado de trabalho, nos dias de jogos da nossa seleção, o corpo social demonstra passividade no que concerne à necessidade de valorizar as nossas mulheres em todos os aspectos, a começar pela base societária.

Em suma, reforço questões elementares: qual tem sido nosso papel para alterar o entrave histórico do rebaixamento das jogadoras? Como empregados, queremos assistir aos jogos da nossa seleção em bares, restaurantes ou nas casas com os parentes e amigos? Na posição de empregadores, liberaremos nossos funcionários durante as exibições da nossa seleção? Em papel de pais, presentearemos nossas filhas com bolas de futebol como presenteamos nossos meninos desde muito cedo? Na ocasião de filhas, imporemos nossos desejos quanto às práticas esportivas? Como irmãos, permitiremos nossas irmãs como companheiras de equipe na escola ou na rua entre amigos? Enquanto respondemos, mãos à obra: busquemos nossas bandeiras, vistamos nossas camisas da seleção brasileira e liguemos a tevê. Dia 14 tem estreia contra o Panamá. Força, Brasil!

Professor Franco de Paula é graduado em Letras pela Unesp de S. J. Rio Preto. Além disso, possui formação em Pedagogia e pós-graduação em Gestão e Organização da Escola com Ênfase em Coordenação e Orientação Escolar.